domingo, 5 de junho de 2011

BAGÉ Terra de guerreiros

Cidade gaúcha sempre teve nos conflitos a sua grande marca histórica

Se há uma terra onde nunca faltou ocupação para cabra macho, esta é Bagé, na fronteira do Rio Grande do Sul com o Uruguai.
'Peleando' contra os espanhóis, ao lado do imperador, ou apoiando os republicanos, contra o mesmo imperador, os bageenses ainda encontraram tempo até para marchar e ameaçar invadir a Banda Oriental do Uruguai, além de proclamar a República Rio-Grandense. Assim, entre 1773 e 1893, viveram com a garrucha a tiracolo.
Mas Bagé não é boa só de guerra. Está repleta de belezas naturais, ainda pouco exploradas pelo turista. Porta de entrada para o pampa gaúcho, seus campos preservam o bioma natural da região e seu povo não se cansa de mencionar a sua rica arquitetura urbana e rural. Como o gaúcho de fronteira jamais viveu sem um cavalo, só poderia ser por aquelas terras que se encontra o que há de melhor na produção eqüina nacional, principalmente dos puros-sangues ingleses e dos crioulos. E não fica só nisso. Há muito artesanato no Caminho Farroupilha e na Costa Doce, mostrando a carteira de identidade cultural de uma área que serviu de cenário para refregas político-militares, numa rota que liga Bagé a cidades como Caçapava do Sul, Santana do Livramento, Piratini, e Camaquã, entre outras.
A paisagem encanta. os campos verdes, entrecortados por coxilhas, rios e arroios, atrativos de forte apelo. Quem conferir, vai andar a cavalo, junto com o gaúcho fronteiriço, em meio a bois, vacas, e ovelhas, além de saborear um autêntico churrasco gaúcho.
A Festa Internacional do Churrasco, que se realiza em novembro.é a maior churrascada do mundo, numa área de 240 hectares. Durante quatro dias de muitas festanças, é armada, paralelamente, a Festa Campeira.
Arrebanhado os tchê de todas as querências. É feito um buraco no chão e, dos espetos, salta carne em abundância. Isso, junto com muita crioulaça, gineteada, cancha reta, penca de peitiços e mateada, atrações que incluem – e incluirão sempre – um homem e um cavalo. Também tem os passeios em carroça e muita música, cultura e arte gaúcha, além de tango e canto sem fronteira.


Com coxilhas e arroios
Bagé sediou as duas principais revoluções no Rio Grande do Sul, a Farroupilha, entre 1835 a 1845, e a Federalista, em 1893
botando-se o pé no Caminho Farroupilha, a trilha se abre para encontrarmos no tempo com velhos heróis farrapos, entre eles, Bento Gonçalves, Giuseppe Garibaldi, Gomes Jardim e o General Souza Netto, que, em 11 de setembro de 1836, após vencer a Batalha do Seival, na margem esquerda do Rio Jaguarão, proclamou a República Rio-Grandense.
Viajando-se por aquela rota de tantas batalhas do passado, pode-se embrenhar pelas grutas e cavernas que serviram de esconderijos às tropas farroupilhas, conhecer a Charqueada São João cenário para a minisérie global A Casa das Sete Mulheres, que narrou as escaramuças de dez anos entre gaúchos e imperialistas, e atracar no porto de Rio Grande, ponto estratégico dos revolucionários.
Passeios imperdíveis
Se no centro histórico de Bagé pode-se conhecer antigos casarões, sobrados e museus bem preservados, como o de Dom Diogo de Sousa, quase réplica do Palácio de Queluz, em Portugal, outro programa imperdível da região de Bagé é conhecer as estâncias e conversar com os estancieiros. É a hora de vivenciar as lides campeiras e de conhecer um ecossistema único (o pampa) que integra o nosso povo ao Uruguai e à Argentina.
Para o amante do turismo ecológico, a região de Palmas, por onde rola o Rio Camaquã, distante 38 quilômetros do centro de Bagé, é perfeita para trilhas, escaladas e rapel. Ali está o Galpão de Pedra, que abrigou revolucionários federalistas, o misterioso Rincão do Inferno, os Picos do Morcego e do Elefante e a Toca do Sapateiro.
Alguns pontos turísticos urbanos imperdíveis de visitar: Igreja de São Sebastião de Bagé – de 1820, recebeu, em 1885, a visita da Princesa Isabel e do seu marido, o Conde D`Eu. Durante a Revolução Farroupilha, em 1893.

O primeiro contato do município com o homem europeu aconteceu na segunda metade do século XVII, quando os padres jesuítas, após fundarem São Miguel, desceram da região dos Setes Povos das Missões e instalaram-se aqui, fundando a Redução de Santo André dos Guenoas, em 1683. Porém, os índios daqui (que os padres pretendiam catequizar) eram rebeldes em relação aos índios missionários e aos homens brancos e destruíram a redução.

Mais tarde, em 1750, Portugal e Espanha assinaram o Tratado de Madri, pelo qual os portugueses renunciavam à Colônia de Sacramento em troca de terras do atual Rio Grande do Sul e da expulsão dos Setes Povos para a outra margem do Rio Uruguai. Mas quando, em 1752, os dois exércitos – português e espanhol – chegaram nos campos de Santa Tecla para demarcar as fronteiras, foram rechaçados por 600 índios charruas (tribo predominante nesta área), comandados por Sepé Tiarajú, que teria dito que aquelas eram “terras que Deus e São Miguel lhes haviam dado”.

Alguns anos depois, em 1773, o Governador de Buenos Aires, D. Juan José Vertiz y Salcedo, com 5.000 homens, partiu do Prata para expulsar os portugueses do Rio Grande do Sul. Chegando aqui, fundou o Forte de Santa Tecla, do qual ainda existem demarcações. O forte era cercado por um fosso de 9 metros de largura e 2,5 de profundidade, tinha muralha de 3 metros de altura e baluartes que alcançavam 5,5 metros. O Forte foi arrasado duas vezes. A primeira, em 1776, Rafael Pinto Bandeira o invadiu e expulsou os espanhóis, destruindo parte de sua construção.

Depois de assinado o Tratado de Santo Idelfonso, em 1777, uma guarnição espanhola ocupou novamente o Forte, e os portugueses se estabeleceram numa Coxilha que recebeu o nome de São Sebastião – Guarda de São Sebastião.

Em 1801, os espanhóis abandonaram todos os seus postos avançados, inclusive o Forte de Santa Tecla, que foi, pela segunda vez, demolido e arrasado. O território passou definitivamente aos portugueses, e as terras bageenses foram ocupadas por sismeiros ou arrendadas a pessoas que se destacaram nos combates travados.

Em 1810, algumas das colônias espanholas conquistaram sua independência da metrópole, e em meados do ano seguinte, em 1811, o governador do Rio Grande do Sul, Dom Diogo de Souza, concentrou o exército português nas fronteiras, temendo alguma ação dos recém-separados espanhóis. Assim, montou seu acampamento próximo aos “Cerros de Bagé”, local onde hoje está situada nossa cidade. Segundo alguns historiadores, em 17 de julho de 1811, D. Diogo partiu com suas tropas para invadir o Estado Oriental del Uruguay, deixando aqui várias pessoas que não puderam acompanhá-lo e que originaram o município. A data de fundação de Bagé – 17 de julho de 1811 – bastante discutida até hoje, foi estipulada em 1963, por ocasião do Congresso do Segundo Centenário do nascimento de Dom Diogo de Souza.

Quanto à origem do nome Bagé, há várias hipóteses, todas elas ainda discutidas. Há quem diga que no local onde hoje está situada Bagé, viveu um cacique minuano chamado Ibajé. O índio Ibajé estaria enterrado no Cerro de Bagé, e do seu nome teria se originado o nome da nossa cidade. A existência desse índio nunca foi comprovada, sendo mais provável que seja uma lenda. A hipótese mais aceita é aquela que diz que a origem do nome Bagé vem da linguagem indígena, e está relacionada com a idéia de “cerros”. Os índios tapes chamavam os Cerros de “mbaiê”, porém a expressão mais aceita para a origem do nome da cidade é “bag”, outra expressão indígena que também significa “cerros”.

A povoação foi aumentando devagar, espalhando-se ao redor da Praça da Matriz (onde seria o centro do acampamento), e uma igreja, muito simples, foi construída (em 1820) para abrigar a imagem do padroeiro da cidade, São Sebastião, trasladada em 1813 da Guarda da Coxilha para Bagé.

Mesmo após a demarcação definitiva das fronteiras, as terras do município de Bagé continuaram a presenciar guerras e batalhas. Em 1825, D. Carlos de Alvear invadiu o território gaúcho, e no início de 1827, as forças do general Lavalleja entraram em Bagé, saqueando, queimando e destruindo o que encontravam pela frente. No ano seguinte, a assinatura do Tratado de Paz devolveu o sossego à fronteira.

Em 1835 foi a vez dos gaúchos batalharem entre si. A eclosão desta nova disputa deu-se não pelos antigos objetivos de conquista de terras. Agora, os motivos eram outros: estavam em jogo os ideais de republicanos e imperialistas. Bagé, mais uma vez, viu seus campos servirem de palco para diversas batalhas. Uma das mais importantes e lembradas, a “Batalha do Seival” foi travada em 10 de setembro de 1836 nos Campos do Seival. As tropas republicanas, comandadas por Antônio de Souza Netto, saíram vitoriosas e, no dia 11 de setembro, o mesmo General Netto, no atual Campo dos Menezes, margem esquerda do Rio Jaguarão, proclamou a República Rio – Grandense.

Finda a Revolução Farroupilha, Bagé foi elevada à categoria de freguesia, em 18 de maio de 1846, e de vila, em 5 de junho do mesmo ano. Foi reconhecida como cabeça de comarca em 22 de dezembro de 1858 e, quase um ano depois, em 15 de dezembro de 1859, foi elevada à categoria de cidade
Outra revolução eclodiria na Província em 1893, quando os federalistas reagiram à ascensão dos republicanos ao poder. Em 11 de fevereiro, Gumercindo Saraiva invadiu o Rio Grande do Sul pelo Rio Jaguarão e, no Passo do Salsinho, foi travado o primeiro combate. Durante a Revolução de 1893, o município testemunhou ainda o Combate das Traíras, o Cerco do Rio Negro e o Sítio de Bagé. No Rio Negro, 300 prisioneiros foram degolados sem poderem esboçar defesa. O Sítio de Bagé teve como palco a Praça da Matriz e a Catedral, que ficou sitiada quando os revolucionários tentaram tomar a cidade. Foram construídas trincheiras e, sob o comando do Coronel Carlos Telles, os pica-paus (defensores do governo oficial) resistiram à invasão. Como não podiam sair, tiveram que enterrar seus mortos ao lado das torres da Igreja.

Com mais uma Guerra terminada, o início do século XX mostrou-se promissor para a cidade, que reunia várias qualidades capazes de transformá-la num centro industrial e agrícola.

Relatos do início do século contam que o clima de Bagé era bem definido e o solo abundante em riquezas naturais, destacando-se já as minas de carvão de pedra em Candiota e no Rio Negro. Na pecuária, Bagé contava com uma boa produção de carneiros, bois e cavalos. A agricultura, embora a cidade já exportasse trigo desde 1835, encontrava-se um pouco mais atrasada que a pecuária, e os produtos de destaque eram o trigo e o arroz.

A tradição de realizar exposições-feiras parece bem antiga. há relatos de uma, ocorrida no princípio do século, no então Hipódromo Vinte de Setembro, adaptado para receber gado de leite, de corte e eqüinos. A seção agrícola teve mostras de trigo, cereais e frutas, destacando-se os vinhos feitos com vários tipos de uvas plantadas na região, todas de primeira qualidade. Houve também a seção industrial, com produtos de arte gráfica e livros.

Bagé contava com um progresso urbano considerável, estando inclusive favorecida com relação a outras cidades. A estrada de ferro já havia sido inaugurada no século anterior, em 1884, com a conclusão do trecho Bagé – Rio Grande, assim como a luz elétrica, inaugurada em 1899. Bagé foi a primeira cidade do Rio Grande do Sul e a terceira do Brasil (atrás de Campos – RJ e Juiz de Fora – MG) a ter energia elétrica, mostrando o progresso da cidade. No início do século, a cidade já contava com bens e serviços de higiene pública e rede telefônica. Os serviços de abastecimento de água encanada e potável e esgotos demoraram um pouco a sair do papel, mas mesmo assim, em 1913 entrou em funcionamento a Hidráulica Municipal. As estradas também eram boas.

Em Bagé, por essa época, já se encontravam bancos (como o Pelotense e o de Emílio Guilayn), clubes (como o Caixeral e o Comercial), e hotéis. O Hotel do Comércio talvez seja um dos melhores exemplos do poder da cidade na época: inaugurado em 1842 por um francês, foi sofrendo reformas e melhorias até tornar-se um dos melhores hotéis do Estado, extremamente luxuoso e referência para outros estabelecimentos.

A vida social da cidade era muito animada, sendo famosas as festas e “recepções” onde se destacavam já as mulheres rio grandenses e sua beleza. Mas as “festas” preferidas da população, principalmente entre os de maior poder aquisitivo, eram as corridas de cavalos. Já no começo do século o município era conhecido pelas qualidades dos belíssimos eqüinos aqui criados.

O comércio era bastante variado e movimentado, e vários produtos importados diretamente dos principais países europeus, como França, Itália, etc., podiam ser encontrados com facilidade.

Outros destaques da Bagé do início do século eram a qualidade do ensino oferecido e a bonita arquitetura urbana, com influência predominantemente portuguesa, destacando-se os palacetes e sobrados. As ruas eram bem calçadas e arborizadas.

As famosas charqueadas, muito presentes nesta parte do Estado na época, também tinham destaque. Elas movimentavam a economia local e estadual. A prova da importância das charqueadas para Bagé é que eram estas quem mais empregavam pessoas no começo do século.

Devido à importância da cidade para a região, ganhou o apelido de “Rainha da Fronteira”. Já formou renomeados artistas plásticos e ofereceu ao Brasil importantes nomes das mais variadas áreas, desde o lateral-esquerdo da seleção Branco até o ex-presidente Emílio G. Médici. Sedia a Universidade da Região da Campanha – URCAMP, possui um instituto musical ativo, além de outras manifestações culturais. Mantém vivas as tradições do gaúcho e oferece a seus cidadãos e visitantes a possibilidade de admirar prédios históricos, participar de atividades culturais, conviver com hábitos típicos da região e muito mais.

Breve História do Forte de Santa Tecla




O Forte de Santa Tecla teve sua fundação em 1774, no contexto da invasão espanhola de 1763 a 1776. Seu fundador foi o Governador de Buenos Aires, Dom Juan José Vertiz y Salcedo. Dom Juan saiu do Prata com uma guarnição de 5.000 homens, em 1773, com o objetivo de expulsar os portugueses do território gaúcho. Atingiram Santa Tecla, posto avançado de São Miguel das Missões, no início de 1774. Esta fortificação foi construída pelo engenheiro Bernardo Lecocq, que acompanhava Dom Juan, com ajuda dos índios Charruas que viviam na região. Os índios, cansados de batalhar e serem massacrados pelos portugueses, aceitaram ajudar os espanhóis a construir o forte porque em troca receberiam armas de fogo para lutar contra os lusitanos. O Forte era cercado por um fosso de 9 metros de comprimento por 2,5 metros de profundidade, em formato de estrela. Suas muralhas possuíam 3 metros de altura, tendo seus baluartes 5,5 metros de altura. Sua dimensão, tendo como base uma foto de satélite do local, era aproximadamente de 88 metros do lado oeste, 95 metros seu lado leste, 105 metros ao norte e 110 metros ao sul, tendo em seu total 14.175 m² de área. Em forma de um pentágono, suas fundações de pedra e cimento seguravam suas paredes levantadas com leivas de barro socado e construções de pau-a-pique, distribuídas em torno da praça de armas na sua área central. O barranco do rio Negro, que antecede o rio e não a taipa, como alguns autores descrevem, servia-lhe de proteção natural pelo lado norte. Sua importância se dava pela sua estratégica localização, onde de lá, se pode ver o Uruguai a “olho nu”, em seu ponto mais alto, o baluarte San Agustín. Nos outros baluartes, denominados San Miguel, San Juan Bautista, San Jorge e o que fechava a 5ª ponta do pentágono, à beira da ribanceira, San Francisco, era possível, em cada um deles, ver um ponto diferente das fronteiras, tendo assim, uma visão geral de toda a região. Possuíam também, cada um dos baluartes, canhões para defesa do forte.
Anterior a fundação, em 13 de janeiro de 1750, foi assinado o Tratado de Madri, entre Dom Fernando VI da Espanha e Dom João V de Portugal. Este tratado estabelecia que Portugal cedesse a Colônia do Sacramento e as suas pretensões ao estuário da Prata, e em contrapartida receberia os atuais estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul (território das missões jesuíticas espanholas), o atual Mato Grosso do Sul, a imensa zona compreendida entre o Alto-Paraguai, o Guaporé e o Madeira de um lado e o Tapajós e Tocantins do outro, regiões estas desabitadas e que não pertenceriam aos portugueses se não fossem as negociações do tratado. Foi nessa época que, para garantir a validade do tratado, partiram de Santos 60 casais para se estabelecer na região da atual Porto Alegre. Esses casais fundaram o então Porto dos Casais. Foi uma primeira tentativa de paz entre os países ibéricos. Este tratado revogou o velho Tratado de Tordesilhas, estabelecido em 1494.
Foram nomeados o Coronel Francisco Antônio Menezes e o Capitão Juan Echvarria, respectivamente Portugal e Espanha, para demarcar os territórios previstos no tratado a mando dos Reis. Em 23 de fevereiro de 1753, chegaram os demarcadores responsáveis pela região do atual município de Bagé, onde, na proximidade de pouco mais de 1km do local que mais tarde foi construído o forte, existia uma pequena igreja, a capela de Santa Tecla. Ali eles foram recebidos por uma guarnição guaranítica comandada por José Sepé Tiarajú que os impediu de avançar pelo território. Assim, o trabalho de demarcação desta região foi suspenso temporariamente, obrigando portugueses a voltar para a colônia e os espanhóis para Montevideo. Era provável, pois em minhas pesquisas os números foram variando de fonte para fonte, que Sepé tivesse ao seu lado em torno de 600 homens, enquanto que os demarcadores, apesar de melhor armados, com armas de fogo, possuíam um Contingente de 100 homens. Após a batalha, a guarnição guaranítica combateu novamente os europeus, desta vez na famosa batalha de Caboaté, em 1756, resultando na morte de seu líder, José Sepé Tiaraju.
Em 23 de março de 1776, após 26 dias cercando o Forte, o sargento Rafael Pinto Bandeira, junto de seu contingente de 1500 homens, derrotou os 200 espanhóis que se instalaram no forte. Antes de sair rumo a Rio Grande de San Pedro, onde também conseguiria a vitória sobre os espanhóis, Pinto Bandeira mandou incendiar e destruir o Forte de Santa Tecla.
O Forte foi novamente palco de desentendimentos nas discussões a respeito de demarcações de um novo tratado, o de Santo Ildefonso, assinado em 1777. Com isso, por seu grande valor estratégico, o primeiro vice-rei do Rio da Prata, Pedro de Cevallos, mandou reconstruir o forte, em 1978.
O vice-rei do Brasil D. Luiz de Vasconcellos e Souza, acerca do progresso das demarcações devidas pelo Tratado de Santo Ildefonso (1777), informa:
"Com a contradição manifesta aos sobreditos artigos [4, 5 e 6º do Tratado de Santo Ildefonso, 1777] pretendeu o comissário espanhol no progresso das demarcações das principais vertentes do rio Negro e Piraí, que o Forte de S. Tecla, situado dentro do espaço intermédio, ficasse pertencendo à Espanha, torcendo-se e estreitando-se a linha divisória para a parte de Portugal, a fim de ficar salva a pequena distância de três quartos de légua, em que se acha o dito forte, depois de assinalados os limites de ambas as nações. Conserva-se presentemente este forte em tão mau estado, que nada perde [a] Espanha em se arrasar e demolir: os seus parapeitos estão por terra em quase todo o recinto, o seu fosso no nível da campanha, e os seus quartéis mal servem de abrigo a uma guarnição de quarenta homens. A sua construção sempre foi [a] de um forte de campanha ou de registro, com figura irregular pentagônica, composto de três baluartes e de dois meio baluartes construídos de torrão, sem maior resguardo. A única utilidade que alucina aos espanhóis para se conservar o dito forte, se reduz a impedir os contrabandos das inumeráveis cabeças de gado vacum de que abundam aquelas grandes campanhas: mas é certo que existindo semelhante fortificação no meio de uma região deserta, e cruzada além disso de tantas estradas e veredas, para Maldonado, Montevidéu, Missões, Rio Grande e Rio Pardo, nem se podem conseguir aquelas aparentes vantagens, nem também deixarão de ocorrer motivos de discórdia entre os vassalos dos dois domínios, por ficar aquela vigia tão próxima da linha divisória por parte de Portugal, e tão remota e separada das outras povoações pertencentes à Espanha, infringindo-se conseqüentemente as regras mais certas da recíproca segurança, que o mesmo Tratado prescreve. (...) de comum acordo se entrou a demarcar o terreno compreendido entre as vertentes do Ibucuí-guassu até às imediações da falda meridional do Monte-Grande. Então é que conheceu o nosso comissário que, aceitando a nova proposição que lhe fez o seu concorrente, de admitir o curto espaço de légua e meia entre os limites do terreno neutral, se podiam melhor adiantar e estender os domínios de S. M., sem se embaraçar entretanto, com a única objeção de ficar inteiramente salvo e fora dos limites daquelas reservas o sobredito insignificante Forte de S. Tecla, que em qualquer caso de dever ou não existir, não embaraçava o recurso do expediente proposto, e só podia servir de obstáculo para não se verificarem as conhecidas utilidades, que se representavam para Portugal naquela demarcação." (Ofício de 20 de Agosto de 1789. RIHGB. Rio de Janeiro: Tomo IV, 1842. p. 7-9)
E conclui, sobre o assunto:
"Não deixa contudo de fazer algum obstáculo [à demarcação] o dito Forte de S. Tecla, por não exceder ali o terreno neutral a curta distância de légua e meia, ficando posto e aquela vigia em um lugar tão arriscado, e tão próximo à linha divisória, contra a forma estipulada no art. 6º. Mas nem por isso deixou o primeiro marco do lado da Espanha de ficar muito contíguo ao dito forte, que não deixara por esse motivo de vir a ser demolido, como se deve esperar da prevenção com que D. José Varella tem premeditado mudá-lo para um dos três cerros de Bahé, que existem pouco mais de três léguas ao sudeste da linha divisória." (Ofício de 20 de Agosto de 1789. RIHGB. Rio de Janeiro: Tomo IV, 1842. p. 7-9).
Porém, novamente tropas portuguesas, dessa vez do chamado Regimento de Cavalaria de Dragões do Rio Grande do Sul, em 1801, ao comando do coronel Patrício Correia da Câmara, Primeiro Visconde de Pelotas, destruíram definitivamente o Forte de Santa Tecla.
Em 1811, dez anos mais tarde, no sítio histórico do Forte, Dom Diogo de Souza concentrou suas tropas para invasão da Banda Oriental do Uruguai, o que deu origem ao primeiro povoamento da atual cidade de Bagé.

Pesquisas arqueológicas foram realizadas no sítio do Forte nos anos 1970. Para executá-las foram contratados dois profissionais na tentativa desvendar os vestígios do Forte. Um deles era o Arqueólogo da Universidade de Caxias do Sul, Fernando La Salvia, e o outro era o Historiador, Engenheiro e Arquiteto Francisco Riopardense de Macedo, ambos falecidos. A única coisa que nos resta desta intervenção é um pequeno relatório, sem muitas informações que La Salvia enviou ao Sr. Dr. Julio Nicolau De Curtis, na época representante do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Neste relatório, La Salvia discorre que, durante as escavações, foram encontradas as fundações do Forte, comprovando sua existência, também que, na limpeza feita nos dois poços existentes no local, foram encontrados ossos de animais, troncos, rodas de carretas maciças, uma culatra de canhão, pedaços de móveis e outros materiais menores, que eu presumo que fossem objetos pertencentes aos habitantes do forte. Nas escavações foram encontrados, além dos alicerces do forte, material de construção como pregos, restos de ferro, cerâmica, louça e, raramente, descreve ele, porcelana. Todo esse material encontrado por La Salvia não se sabe onde foi parar. O que o governo de Bagé sabe é que, o que estava na residência de La Salvia, sejam documentos ou achados, foi tudo para o lixo. A Família de La Salvia alega, segundo a Secretária de Cultura do Município, Roséli Safons, que, após sua morte, por desconhecimento do que ele tinha em seu escritório, encaixotaram tudo e colocaram para o caminhão do lixo levar. Todos torcemos para que isso não seja verdade e que, em algum lugar, estas peças estejam escondidas ou guardadas. Por esses e outros motivos, a intervenção feita por La Salvia foi considerada "desastrosa" por intelectuais, acadêmicos e moradores da região.
Este ano, fui convidado a também participar da elaboração do Projeto "Parque do Forte Santa Tecla", que visa a preservação e revitalização do sítio arqueológico do Forte. Minha primeira missão, além de desenhar e elaborar o projeto, foi visitar o forte e fazer uma análise de como seria possível uma segunda intervenção arqueológica no local. Perguntei como estavam as ruínas e o sítio e sempre me diziam: "Não tem nada lá!", ou "Não se vê nada". Duvidei, evidentemente destes depoimentos, pois, num sítio arqueológico rico como é o caso do Forte era muito improvável que nada estivesse lá ou nada pudesse ser visto. Nos meus primeiros passos já pude ver, de cara, as fundações do forte e seu contorno. São muito claras as evidências das fundações. Acredito que, fazendo uma nova intervenção arqueológica no local, será possível "emergir" as fundações para que fiquem bem claras para os visitantes do novo parque. Convidei o Prof. Dr. Fábio Vergara, da Universidade Federal de Pelotas, para vir dar seu aval sobre o forte e, ao acharmos uma trilha que levava até o final da ribanceira ao norte do forte, podemos enxergar algo que pode ser uma das maiores descobertas no sítio do forte desde as intervenções anteriores ou até algo que pode ser maior ainda: pedras que provalvemente são as que constituíam as paredes do forte e o local de onde provavelmente eram extraidas! Ficou muito claro para nós que alguns daqueles amontoados de pedras lá embaixo existentes eram pedras que de fato constituíam o forte, empurradas morro abaixo pelos portugueses que tomaram o forte duas vezes ou, talvez, tenham caído com o tempo, naturalmente. Pedras claramente cortadas a mão pelos construtores. Minha esperança, ao longo da nova intervenção é, também, achar objetos dos habitantes do forte ou das guarnições guaraníticas que por ali passavam. Esperamos que no futuro, mais objetos, pedras e fundações sejam encontradas, identificadas e retiradas de baixo da terra ou da ribanceira. O sítio é, sem dúvidas, rico e, praticamente, inexplorado. Sua interação com a comunidade pode e deve ser feita, ao longo deste projeto, podendo até ter muitos dos interessados ajudando voluntariamente os profissionais que ali estarão trabalhando.


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BAGÉ EM 1983
PRAÇA ESPORTE EM 1989